Diário de Um Jardim

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terça-feira, fevereiro 15, 2005

Dignas de Destaque São As Palavras de Um Caracol

"Desculpem-me pela intromissão. Digo desde já que não sou jardineiro, mas gosto muito de flores e belos jardins. Outrora tive medo de abelha, mas não é mais o caso. Sua graciosidade, fluidez e, principalmente, sua paixão em sempre recomeçar, me encantam. Aliás, foi através do zumbido de uma certa abelha que fiquei sabendo da existência desse jardim. E a curiosidade não cessou, ..., será algo como o “Jardim de Epicuro”? ... Tive que conferir!Considerem-me um caracol de jardim, desses que vivem à sombra das flores, em sua longa obstinação. O que seria dele se, ao levantar os olhos, não se deparasse com a irresistível beleza das flores. E, sem estas, seu mundo não seria apenas menos belo, mas sim, muito mais perigoso. Caracóis são delicados e torram-se ao sol direto. Do jardim, ele ainda vislumbra a abelhinha em seu vôo ao cair da tarde, ..., tão perto e tão distante... Digna de admiração, porquanto emancipada das condições telúricas.O girassol segue a sua luz. O caracol, por vezes, não acredita que exista algo a ser seguido. Vive sobre a terra úmida e, às vezes, sente-se, ele próprio, terra também.E a Rosa? Será uma cativante rosa vermelha? Uma tranqüila rosa branca? Uma sincera rosa amarela? Uma indecifrável rosa chá? Uma autêntica rosa rosa? (Por que a fixação em tipos tão puros? Não seria melhor uma combinação de todas elas?). Ele não a viu. Mas, ao entrar no jardim, percebeu sua presença, sentiu seu perfume e, neste pequeno universo, medido pelo espaço sem céu e pelo tempo sem profundidade, o caracol disse consigo mesmo: “Acho que tudo está bem”, e essa é uma fala sagrada, ..., de tantas reminiscências ..., pois ela ecoa neste universo feroz e limitado (um jardim!?) e o lembra que tudo não foi e não está esgotado ... Sentiu-se bem. E este contentamento silencioso o acompanhará em sua procura (O que procura o caracol?) ... Cada grão desse jardim, cada pedrinha, cada flor, para ele constituem um mundo. E o caracol, continuando sua busca, reconhece que a própria busca é suficiente para preencher um coração humano (ops!, digo, de caracol).Certamente, ao percorrer as alamedas e recônditos deste jardim, o caracol formou, ainda que intuitivamente, algumas idéias acerca de seus habitantes. Contudo, não poderia externá-las antes de seguir o conselho de Montaigne, ou seja, falar de si próprio. Talvez, à guisa de apresentação."

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